Foto: Joédson Alves
Uso excessivo de tecnologia não é, necessariamente, um vício, pode ser falta de orientação. Essa é a principal defesa da psicóloga e pesquisadora Anna Lucia Spear King, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Fundadora do Instituto Delete, pioneiro no Brasil no estudo sobre os impactos da tecnologia na saúde mental, ela destaca a importância da educação digital para um convívio mais saudável com as telas.
Cada vez mais conectadas, muitas pessoas relatam dificuldades para se desconectar. É comum começar o dia checando o celular, passar as refeições diante de uma tela e terminar a noite rolando redes sociais. Mas quando esse uso começa a afetar o cotidiano, é hora de acender o alerta.
Não é vício, é má educação digital
Segundo King, a maioria das pessoas que procura ajuda no Instituto Delete não é, de fato, viciada. “Elas usam sem hora, sem limite, sem regras. Não precisam de tratamento, precisam de educação digital”, afirma. A especialista diferencia o uso excessivo da dependência patológica, conhecida como nomofobia, quando há associação com transtornos como ansiedade, depressão ou compulsão, e o uso da tecnologia vira uma fuga.
Sinais de alerta!
O problema é identificado quando surgem prejuízos na vida pessoal, profissional ou acadêmica. Atraso em entregas no trabalho, conflitos familiares e baixo rendimento escolar estão entre os sinais mais comuns. Para casos mais graves, o tratamento envolve apoio psicológico e, se necessário, acompanhamento psiquiátrico.
Jogos eletrônicos e apostas on-line são os grandes vilões da vez. De acordo com King, essas plataformas são projetadas para liberar substâncias químicas que causam prazer, como dopamina e serotonina. “Quando a vida real não oferece o mesmo estímulo, a pessoa volta ao jogo em busca daquela sensação”, explica.
Atenção redobrada com crianças e adolescentes
Um ponto crítico da discussão é o impacto nas novas gerações. Para a especialista, os pais são os responsáveis pela educação digital dos filhos. “Adolescente não pode usar internet sem supervisão. A rede está cheia de riscos e não pode ser tratada como território neutro”, alerta.
A falta de preparo dos próprios adultos — que não foram educados digitalmente — acaba criando um ciclo de desinformação. “Ninguém aprendeu desde pequeno como usar a tecnologia com consciência. Mas quem paga o wi-fi? Quem permite o uso excessivo?”, questiona.
Escolas sem celular: medida positiva
A nova lei que restringe o uso de celulares nas escolas foi bem recebida pela pesquisadora. Para ela, a tecnologia deve ser usada apenas com orientação pedagógica. “É hora dos jovens interagirem, praticarem esportes, desenvolverem habilidades sociais. Cada um no seu canto com o celular, isso não é desenvolvimento.”
Dicas práticas para uma vida digital equilibrada
King lista hábitos simples que podem melhorar a relação com as telas:
- Evite usar o celular assim que acordar. Comece o dia com calma.
- Desligue os aparelhos duas horas antes de dormir, para relaxar o cérebro.
- Nada de celular nas refeições. Aproveite a comida e a companhia.
- Foco total no trabalho durante o expediente — e nada de tarefas fora do horário.
- Valorize o tempo presencial com amigos e família. O momento real vale mais que curtidas.
No fim das contas, a mensagem é clara: a tecnologia é uma aliada, mas só se for usada com consciência. Para isso, é essencial aprender e ensinar a usar com responsabilidade.